E O VENTO LEVOU (1939)

(Gone With the Wind)

4 Estrelas

 

Dirigido por Victor Fleming.

Elenco: Clark Gable, Vivien Leigh, Leslie Howard, Hattie McDaniel, Olivia de Havilland e Thomas Mitchell.

Roteiro: Sidney Howard, baseado em livro de Margaret Mitchell. 

Produção: David O. Selznick. 


Dirigido por quatros pessoas diferentes e com uma duração que praticamente bate nas quatro horas, a trajetória de Scarlett O’Hara firmou-se como um épico grandioso com imagens belíssimas e uma linda trilha sonora, marcando a história do cinema, mesmo que em diversos momentos seja melodramático demais. A superprodução de David O. Selznick muitas vezes lembra as telenovelas que ainda fazem sucesso nos dias de hoje, com atuações caricatas e situações escancaradamente óbvias, com a importante diferença de que este filme é de 1939. Para entender sua importância é preciso saber que na época em que foi feito o cinema era deste modo, com atuações exageradas, cheias de caras e bocas e normalmente com um roteiro óbvio, meio auto-explicativo, para que as pessoas pudessem entender corretamente o filme.

Scarlett O’Hara (Vivien Leigh) era a menina mimada que sonhava casar-se com Ashley Wilkes (Leslie Howard). Adorada por praticamente todos os homens de sua comunidade, só não conseguia o amor da pessoa que realmente a interessava. Ao saber que seu amado iria se casar, Scarlett parte para tentar conquistá-lo, sem sucesso. Ao receber o convite para morar junto com ele e sua esposa em Atlanta ela deixa Tara, sua terra natal, para viver uma odisséia cheia de dificuldades, em um período de guerra entre o norte e o sul dos EUA, e paralelamente a tudo isto, um romance com o igualmente interesseiro Rett Butler (Clark Gable). A primeira etapa do filme se concentra basicamente na decadência de Tara e da família O’Hara e a segunda se concentra na relação entre Scarlett e Butler e no estudo da personalidade de Scarlett O’Hara.

O roteiro de Sidney Howard apresenta diálogos bem interessantes, apesar da obviedade de algumas situações como duas mortes idênticas, em que a segunda delas se torna totalmente previsível, e de incluir momentos melodramáticos e desnecessários como a cena em que Butler volta de Londres. O destaque fica por conta dos diálogos envolvendo Scarlett, sempre egoísta e mimada, e Butler, sempre sarcástico. A conversa dos dois na Biblioteca após a revelação dela para Ashley é no mínimo muito bem humorada. Além disso, algumas frases ditas por Scarlett são muito bem sacadas e explicam a idolatria que a personagem teria em sua época, representando a força da mulher que hoje já podemos ver em praticamente todos os setores da sociedade, mas que naquele tempo soavam bastante ousadas. Frases como “Acho que cometi um assassinato, mas não vamos pensar nisso hoje, só amanhã” e “Ashley vai voltar. Vamos plantar mais algodão, o preço vai disparar” são momentos sensacionais que demonstram como Scarlett era ao mesmo tempo uma mulher egoísta e, por outro lado, extremamente ousada e independente.


A atuação de Vivien Leigh é bem exagerada, com mudanças constantes de humor e feição, como na cena em que sua amiga Melanie (Olivia de Havilland) pede para que ela cuide de seu marido caso ela morra no parto. Repare como ela muda repentinamente de um rosto triste para um rosto alegre, sem muita elegância na transição. Isto não deve ser um demérito para a atuação dela, já que na época, como já dito, era bem comum este tipo de atuação. Além disso, seu carisma nos faz ter uma identificação com o personagem, mesmo sabendo que Scarlett não é necessariamente um exemplo a ser seguido. Ela é egoísta, ambiciosa além do limite, deseja o marido da melhor amiga e faz qualquer negócio, inclusive casar três vezes sem amor, para atingir seus objetivos. Mesmo assim o espectador acaba torcendo por ela, o que é mérito da atuação carismática de Vivien. Clark Gable se destaca como o irônico Butler. Repare como ele sorri sutilmente nas inúmeras vezes em que irrita Scarlett e como demonstra com fervor sua dor quando perde alguém importante em sua vida. Já Hattie McDaniel, apesar de também ter uma atuação bastante caricata como Mammy, consegue destaque também por se tornar uma personagem extremamente simpática e importante na trama.


Mas é a direção (que teve o crédito final para Victor Fleming) e a trilha sonora de Max Steiner que realmente se destacam neste imponente épico. Com planos belíssimos e enquadramentos perfeitos, o diretor cria imagens de grande impacto como o impressionante travelling sobre os homens mortos na guerra terminando com o plano da bandeira dos EUA. Destaca-se também a cena da fuga de Atlanta com a cidade em chamas, criada a partir de um incêndio real dos estúdios onde foram filmadas cenas de King Kong, e que por isso, consegue obter tamanho realismo. Além disso, os planos sempre procuram valorizar os belos cenários e paisagens, criando um visual esplêndido. A trilha sonora, que praticamente não para durante toda a projeção, além de bela, tem papel fundamental na trama marcando momentos importantes da estória. Observe como nos três principais momentos do filme o conjunto cenário, movimento de câmera e trilha sonora é exatamente idêntico. Além disso, o tema das cenas é o mesmo: a terra. Não é por acaso. O diretor cria ali momentos crucias da trama, interligados exatamente por serem idênticos. No primeiro deles o pai de Scarlett, Gerald O’Hara (Thomas Mitchell), explica a importância da terra para ela. A árvore, a vista, o movimento da câmera se afastando deles e a belíssima trilha sonora marca o momento. Na segunda cena, Scarlett jura jamais passar fome em sua terra com o mesmo cenário de fundo, a mesma árvore, o mesmo movimento de câmera e a mesma trilha. E na última delas, ela volta para Tara e promete se reerguer, próxima da mesma árvore, com o mesmo travelling, no mesmo cenário e com a mesma belíssima e famosa trilha.


A direção de fotografia de Ernest Haller e Ray Rennahan acertadamente destaca em diversos momentos o vermelho, cor da paixão, tão presente na vida daquelas pessoas, fosse ela paixão por alguma pessoa ou pela terra em que viveram. Na cena em que Scarlett e Butler dançam em um salão os dois estão de preto, destoando de todo o resto, simbolizando o quanto eles são diferentes daquelas pessoas. A direção de arte também consegue criar um cenário marcante, com a ajuda dos figurinos, com vestidos característicos da época vistos na festa inicial do filme.


Com planos belíssimos e cenas memoráveis, E o Vento Levou marca pela imponência em uma época onde obras grandiosas eram raridades. Apesar de escorregar em momentos exageradamente melosos, consegue criar empatia com o espectador e marcar aqueles que assistem. Não à toa resistiu ao tempo e se tornou um dos grandes clássicos da história do cinema.


Leitores, mãos a obra. A Ilha de Lost é toda sua…
Roberto Siqueira

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